Pejotização em debate: FecomercioSP promove live sobre segurança jurídica e competitividade

A contratação de trabalhadores como pessoas jurídicas – conhecida como pejotização – voltou ao centro do debate jurídico, econômico e social no Brasil. Em meio à expectativa pelo julgamento do Tema 1389 no Supremo Tribunal Federal (STF), a FecomercioSP realizou no dia 26/09 uma live para discutir os impactos desse modelo sobre empresas, trabalhadores, sindicatos e a própria arrecadação pública.

Mediado pela jornalista Camila Silveira, o encontro reuniu o presidente em exercício da FecomercioSP, Ivo Dall’Acqua, além de especialistas de peso: o professor José Pastore, referência nacional em relações de trabalho; o advogado Estêvão Mallet, doutor em Direito do Trabalho e professor da USP; a economista Luciana Yeung, professora do Insper; e o jurista Otávio Pinto e Silva, presidente da Comissão de Direito do Trabalho da OAB-SP.

O contexto jurídico e econômico

O debate ganhou força após o ministro Gilmar Mendes suspender, em abril, todos os processos sobre pejotização em tramitação no país. A medida antecede a audiência pública no STF, marcada para 6 de outubro, que deverá orientar a decisão da Corte. A Confederação Nacional do Comércio (CNC) participará da audiência, representada por Ivo Dall’Acqua.

Segundo o presidente da FecomercioSP, modernizar as relações de trabalho é essencial para aumentar a produtividade e a competitividade do Brasil, mas sem abrir mão da proteção ao trabalhador. “Precisamos de regras claras e equilibradas que evitem fraudes, reduzam litígios e garantam segurança jurídica às partes”, afirmou.

A pejotização como fenômeno produtivo

José Pastore destacou que a pejotização é reflexo de transformações globais nos sistemas produtivos, marcados pela especialização e pela busca de competitividade. Médicos, advogados, jornalistas e designers são alguns exemplos de profissionais frequentemente contratados como pessoas jurídicas.

Entretanto, o professor alerta para dilemas jurídicos e previdenciários. “O problema surge quando não está claro se o profissional é um autônomo de fato ou se, na prática, desempenha funções típicas de um empregado regular, com subordinação e habitualidade”, explicou.

Subordinação e insegurança jurídica

Para Estêvão Mallet, o grande desafio é identificar os elementos que diferenciam a relação regida pela CLT de uma prestação autônoma. “Na teoria, sabemos que vínculo empregatício exige pessoalidade, habitualidade, remuneração e subordinação. Mas, na prática, a subordinação é um conceito fluido, que muitas vezes é ampliado pela jurisprudência, gerando insegurança”, afirmou.

Mallet lembrou ainda que, diante das mudanças tecnológicas e da internacionalização das relações de trabalho, a legislação trabalhista brasileira – herdada da década de 1940 – mostra sinais de defasagem.

Os incentivos econômicos

Na análise de Luciana Yeung, a pejotização não é apenas um fenômeno trabalhista, mas resultado de incentivos criados pelo sistema tributário e previdenciário. “Muitas vezes, para um mesmo rendimento, a carga tributária sobre o seletista é maior do que sobre o PJ, o que gera um incentivo econômico para fugir do regime da CLT”, avaliou.

Para a economista, esse descompasso cria distorções que prejudicam tanto a arrecadação quanto os próprios trabalhadores. “Embora o PJ possa ter ganhos líquidos maiores, ele perde acesso a benefícios como FGTS, 13º salário e cobertura previdenciária plena”, acrescentou.

Impactos para empresas e sindicatos

Os especialistas também destacaram os efeitos da pejotização na representatividade sindical e na negociação coletiva. Pastore lembrou que, em muitos casos, PJs dividem espaço com empregados celetistas, criando disputas sobre direitos e remunerações. “É um cenário complexo, que exige soluções práticas para evitar conflitos trabalhistas e sindicais”, disse.

O professor também comparou experiências internacionais, como a da Noruega, onde terceirizados e autônomos negociam condições de trabalho após os empregados formais, usando como referência os acordos coletivos da empresa.

Arrecadação e previdência

Outro ponto sensível é o impacto fiscal da pejotização. Pinto e Silva citou estudo da FGV, encomendado pela OAB-SP, que estimou perda potencial de R$ 382 bilhões por ano na arrecadação federal, caso metade da força de trabalho brasileira fosse contratada como PJ.

Além da queda na arrecadação, há preocupação com a sustentabilidade do sistema previdenciário. Para Pastore, é preciso inovar em modelos de contribuição que incluam trabalhadores autônomos, garantindo proteção mínima sem onerar excessivamente empresas.

STF e os possíveis caminhos

No STF, três pontos centrais deverão ser analisados:

  1. Qual órgão do Judiciário deve decidir se a relação é trabalhista ou civil;
  2. Como caracterizar um contrato civil válido;
  3. Quem deve arcar com o ônus da prova em caso de litígio.

Para Mallet, a decisão poderá redefinir os limites entre autonomia e vínculo empregatício. “O risco é que uma interpretação ampla da subordinação transforme quase toda relação em emprego, o que seria um excesso”, advertiu.

Luciana Yeung destacou que o maior desafio será a clareza do julgamento. “Mais do que o conteúdo da decisão, importa a sinalização que o STF dará. Se não houver segurança, empresas e trabalhadores continuarão inseguros, e o ambiente de negócios seguirá prejudicado”, alertou.

Desafios e perspectivas

O debate evidenciou que a pejotização não deve ser vista como ameaça generalizada às relações de trabalho, mas como parte de um cenário mais diverso e dinâmico. “Não é realista imaginar que todo o mercado vá se pejotizar. Muitas funções exigem confiança, continuidade e vínculo empregatício”, observou Pastore.

Para a FecomercioSP, o caminho está em modernizar a legislação, reduzir incentivos distorcidos e oferecer clareza regulatória. “O objetivo é conciliar produtividade e competitividade com proteção social. Somente assim o Brasil poderá gerar empregos de qualidade e estimular investimentos”, concluiu Dall’Acqua.

Fonte : FecomercioSP

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