Como lidar com a escassez de mão de obra no varejo

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O varejo brasileiro tem convivido, nos últimos anos, com um dos maiores desafios de sua história: a escassez de mão de obra qualificada. Esse problema não se limita às fronteiras do País. Supermercados, redes de distribuição e empresas de bens de consumo em diferentes mercados globais relatam dificuldades crescentes em contratar, treinar e reter profissionais capazes de garantir a continuidade das operações.

No entanto, no Brasil, a situação se agrava em razão de fatores estruturais, como a alta rotatividade e a baixa oferta de capacitação direcionada, além de fatores conjunturais, como a volatilidade da economia e a crescente complexidade das operações. A alta rotatividade, aliás, é uma das marcas mais conhecidas do setor. Estudos apontam que a taxa de turnover no varejo pode ser até três vezes maior do que a de outros segmentos. Isso significa que a cada ciclo, as empresas precisam investir recursos consideráveis em novos processos seletivos, treinamentos e adaptação de equipes. O impacto não é apenas financeiro: há perda de conhecimento, queda de produtividade e instabilidade cultural, já que a renovação constante dificulta a criação de vínculos duradouros entre colaboradores e organizações.

Outro fator que pressiona a escassez de profissionais é a própria natureza sazonal do varejo. Poucos setores experimentam, de forma tão intensa, picos e vales de demanda. Em datas comemorativas, como a Black Friday, ou em grandes campanhas promocionais, a necessidade de mão de obra cresce abruptamente. Já em períodos de retração, os quadros são reduzidos, muitas vezes de forma drástica.

Essa oscilação torna difícil prever a demanda de longo prazo, ao mesmo tempo em que sobrecarrega equipes fixas ou gera gargalos de atendimento quando não há reposição suficiente. Além disso, o varejo moderno deixou de ser um ambiente de baixa complexidade operacional. Se antes bastava executar tarefas repetitivas ligadas à reposição de produtos e ao atendimento básico, hoje as empresas exigem competências múltiplas. Profissionais precisam lidar com sistemas digitais, ferramentas de análise de dados, canais de e-commerce, integrações omnichannel e até inteligência artificial aplicada ao relacionamento com os clientes. Isso cria um abismo entre as habilidades necessárias e as qualificações disponíveis no mercado, tornando o recrutamento ainda mais desafiador.

Porém, muitas vezes, o debate sobre a escassez de mão de obra foca apenas na oferta, como se o problema fosse exclusivamente a falta de pessoas. É importante, no entanto, analisar de que maneira as empresas estão organizando suas necessidades internas e se realmente utilizam seus recursos humanos de forma eficiente. Essa reflexão abre espaço para um reposicionamento: em vez de buscar apenas mais profissionais, o varejo precisa se perguntar como pode obter mais produtividade e flexibilidade das equipes já existentes.

Nesse contexto, a tecnologia desempenha um papel central. Plataformas digitais de recrutamento sob demanda conectam empresas a trabalhadores temporários de maneira ágil e transparente. Ferramentas de gestão de escalas ajudam a dimensionar equipes conforme a necessidade real de cada loja. Soluções de análise preditiva permitem antecipar picos de consumo, dimensionando com mais precisão a força de trabalho.

Essas inovações tornam viável um modelo híbrido: equipes fixas para dar estabilidade e profissionais temporários para reforçar operações em momentos críticos. Esse arranjo reduz custos, evita desperdícios e garante maior resiliência frente às oscilações do mercado. Outro pilar indispensável é o investimento em capacitação. O trabalhador do futuro no varejo não poderá ser apenas um executor de tarefas operacionais. Ele precisará ter domínio de atendimento consultivo, familiaridade com Inteligência Artificial aplicada às vendas, habilidade para operar sistemas em tempo real e competências socioemocionais que favoreçam a criação de experiências mais personalizadas para o consumidor. Essa combinação de habilidades técnicas e comportamentais é a nova fronteira da empregabilidade no setor.

Empresas que entendem a formação como parte de sua estratégia colhem benefícios claros, ampliando a base de talentos disponíveis e aumentando a retenção. Profissionais que percebem oportunidades reais de desenvolvimento e enxergam evolução em sua carreira tendem a permanecer mais tempo. Esse senso de pertencimento, aliado a trilhas de aprendizagem bem estruturadas, ajuda a criar um círculo virtuoso: menos rotatividade, maior produtividade e mais inovação no atendimento.

Vale destacar que a escassez de mão de obra não deve ser vista apenas como um problema conjuntural, mas como um convite para repensar o futuro do trabalho no varejo. As empresas que conseguirem equilibrar eficiência operacional, flexibilidade de modelos e valorização de pessoas estarão em posição privilegiada para enfrentar as transformações em andamento.

O setor caminha para um cenário em que a integração entre tecnologia, capacitação e gestão inteligente de equipes se tornará o padrão, e não exceção. No fim das contas, lidar com a escassez de mão de obra significa reconhecer que o verdadeiro diferencial competitivo não está apenas no preço ou na variedade. O varejo que prosperará será aquele capaz de criar conexões inteligentes entre pessoas, processos e tecnologia, transformando desafios em oportunidades e construindo operações mais humanas, adaptáveis e sustentáveis.

Daniel Anderson é CEO e cofundador da Helppi.
*Este texto reproduz a opinião do autor e não reflete necessariamente o posicionamento da Mercado&Consumo.

Fonte : https://mercadoeconsumo.com.br/03/10/2025/artigos/como-lidar-com-a-escassez-de-mao-de-obra-no-varejo

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