Alimentos devem voltar a pressionar inflação no último trimestre, após 4 meses de queda; entenda

Economia

Após quatro meses de queda, preços de alimentos no varejo devem subir, afetando a inflação geral, que ainda se mantém abaixo do teto da meta

Os preços dos alimentos no varejo devem voltar a pressionar a inflação no último trimestre deste ano, pondo fim a um período de quatro meses consecutivos de comida mais barata.

A virada no gasto com a alimentação no domicílio não deve provocar um descontrole na inflação geral de 2025, que vem perdendo fôlego. Segundo o último Boletim Focus do Banco Central, o mercado projeta que o Índice de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA) encerre o ano com alta de 4,72%, 0,22 ponto porcentual acima do teto da meta, de 4,50%.

Apesar do quadro favorável da inflação em geral, é esperado um certo desconforto no carrinho de compras de alimentos do brasileiro, especialmente nos preços das proteínas, como carne bovina e aves, do café, e de itens in natura, como legumes e frutas, entre outubro e dezembro, segundo economistas ouvidos pelo Estadão. Normalmente, nesse período do ano há mais dinheiro circulando na economia por causa do pagamento do 13 º salário. Isso abre espaço para que o consumidor aceite reajustes.

As pressões nos preços dos alimentos já apareceram nas cotações dos produtos agropecuários no atacado nos dois últimos meses, revertendo a trajetória de queda. Estudo feito pela consultoria 4Intelligence mostra que, entre maio e julho, o Índice de Preço no Atacado (IPA) dos produtos agropecuários, apurado pela Fundação Getulio Vargas (FGV), registrou quedas expressivas.

As boas safras agrícolas, a gripe aviária — que aumentou a oferta interna de aves antes destinadas à exportação e pressionou também os preços de outras proteínas, como a carne bovina —, o câmbio e o tarifaço dos Estados Unidos, que inicialmente ampliou a oferta de alimentos no mercado doméstico, foram fatores decisivos para a queda dos preços da comida. De junho a setembro, o grupo alimentação no domicílio no IPCA registrou deflação, como reflexo do recuo dos preços no atacado que houve nos meses anteriores.

Havia uma evolução de preços bastante benigna, que colocou a alimentação doméstica nos últimos meses com taxas até abaixo da sazonalidade, observa o economista sênior da 4intelligence, Fabio Romão. Essa tendência, no entanto, deve sair de cena no último trimestre. “Não é uma coisa horrorosa, mas tinha um bônus, um alívio, que vai deixar de ter”, afirma.

Em agosto, o IPA-DI dos produtos agropecuários subiu 1,53% e em setembro, 1,89%. Como existe um intervalo para a transferência das cotações do atacado para o varejo, a perspectiva é de que os preços da alimentação no domicílio voltem a subir em outubro. No IPCA de setembro, alimentação no domicílio caiu 0,41%, após redução de 0,83% de agosto. Foi a quarta queda consecutiva.

Virada

Marcela Kawauti, economista-chefe da Lifetime Gestora de Recursos, projeta alta de 0,60% para alimentação no domicílio em outubro e elevações de 0,85% e 1% para novembro e dezembro, respectivamente.

A economista acredita que o nível atual do câmbio não se sustenta por muito tempo. É que as incertezas relacionadas à economia dos Estados Unidos irão, em algum momento, se dissipar, levando à valorização global da moeda americana. Além disso, o Brasil tem um problema fiscal muito grande.

Esses fatores combinados devem depreciar o real em relação ao dólar e ter impacto inflacionário. “Boa parte do câmbio mais favorável já foi repassado e dá para ver isso nos dados de preços de alimentação e também de bens industriais”, diz Marcela.

A economista acrescenta o efeito da sazonalidade para justificar a projeção de aumento de preço da comida. Em geral, a inflação de alimentos é menor nos meses de junho, julho e agosto, quando as questões climáticas e a safra ajudam. Mas, no último trimestre, a influência desses fatores cessa.

Também para o economista André Braz, coordenador de índices de preços do Instituto Brasileiro de Economia (Ibre) da FGV, o câmbio é uma variável que pode vir a comprometer os preços dos alimentos, que são muito voláteis. Ele lembra que o câmbio depende dos próximos capítulos da novela “Brasil e Estados Unidos”, depois do tarifaço de Donald Trump.

Apesar do peso do câmbio nos preços das commodities agrícolas, cotadas em dólar, o economista do Ibre/FGV, aposta em aumentos menores de preços para os alimentos para o último trimestre do ano em relação à média do período do ano anterior. “Este não é um ano de efeito climático grande, tem uma oferta maior de produtos, então, isso pode favorecer a continuidade da desaceleração em 12 meses da inflação acumulada em torno de alimentos, o que ajuda a colocar o IPCA mais perto do teto da meta.”

Vilões

Para o último trimestre deste ano, Romão projeta que alimentação no domicílio deve acumular alta de 3,22%, o segundo maior resultado em cinco anos e acima da sazonalidade do período. A mediana da variação desse grupo de preços entre 2011 e 2024 foi de 2,40%. No entanto, no último trimestre de 2024, a inflação da alimentação no domicílio subiu 4,26%, afetada pela forte estiagem.

O estudo da consultoria também aponta os prováveis focos de pressões de preços entre outubro e dezembro. Os vilões devem ser tubérculos, raízes e legumes, com alta de preços projetada de 10,80%, hortaliças e verduras (4,64%), frutas (5,44%), carnes (5,38%), aves e ovos (4,96%) e bebidas e infusões (4,61%), incluindo o café.

O destaque, segundo Romão, será para a carne bovina, cujos preços ainda sofrem os efeitos do ciclo de baixa da pecuária, e para o café, cujos estoques mundiais estão apertados e há problemas de oferta do grão para atender a demanda. ”Vamos ter um final de ano com alta de proteínas, muito provavelmente”, diz o economista.

Para o ano, a projeção da consultoria é de que a inflação de alimentos feche com alta de 5%, para um IPCA cheio de 4,85%. Exceto em 2023 e 2021, desde 2020, a alta de preços da alimentação no domicílio supera a inflação geral, o que é um cenário ruim, diz Romão. Isso porque a despesa com alimentos pesa muito, sobretudo, para a população de menor renda. “Então, é uma sensação térmica ruim.”

Além disso, são vários anos seguidos nos quais grandes altas de preços de alimentos têm se acumulado, sem ocorrer uma devolução. Entre 2020 e 2024, os gastos da alimentação no domicílio subiram 55,8%, enquanto isso a inflação como um todo avançou 33,4%.

Romão diz que a inflação da alimentação no domicílio neste ano poderia ser pior, caso não houvesse tido o recuo dos preços dos alimentos por quatro meses seguidos. Aliás, por causa da desaceleração dos preços dos alimentos e também da taxa de câmbio é que as projeções do IPCA para este ano foram revistas para baixo.

“Não faz tanto tempo assim que o mercado falava no IPCA em 5%, com alguns projetando em 5,5%. E hoje virou: o ponto comum é abaixo de 5%”, diz Romão.

Braz, da FGV concorda com Romão. “A alimentação foi a maior surpresa de 2025, porque se a pressão inflacionária em torno desse segmento continuasse (no ritmo do ano passado), essa expectativa de inflação que a gente vê no Boletim Focus, de desaceleração da inflação (geral) para esse ano e para os próximos, não se sustentaria”, diz.

Só promoção

Apesar da volta de pressões significativas nos preços dos alimentos no final de ano, época de maior consumo, os varejistas terão de ser criativos para impulsionar as vendas.

Estadão apurou que há sinalizações de aumento de preços de 6% para carne bovina aos supermercados para outubro e final de novembro. No caso de produtos sazonais, como panetone, a indicação é de reajuste de 12% e no café fala-se em até 15% este mês para o tipo forte.

Segundo um executivo de uma rede de supermercados, que prefere não se identificar, até julho a empresa estava batendo as metas. Mas desde agosto o quadro mudou. Isso tem obrigado a rede a fazer mais ofertas para atrair o consumidor para a loja.

Uma pesquisa nacional feita pela consultoria Neogrid, entre o final de julho e o começo de agosto com mil consumidores que frequentam lojas de conveniência, revelou que 77% dos entrevistados procuram mercados que oferecem promoções e 60% apontaram promoções e descontos como fatores que mais influenciam na decisão de compra.

Fonte : https://www.estadao.com.br/economia/alimentos-devem-voltar-a-pressionar-inflacao-no-ultimo-trimestre-apos-4-meses-de-queda-entenda

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