Mercado de trabalho no varejo alimentar: Desafios e caminhos possíveis

Alvaro Luiz Bruzadin Furtado

O comércio varejista de gêneros alimentícios vive um momento de paradoxos no mercado de trabalho. De um lado, temos um cenário de aumento da formalização: segundo o IBGE, cresce o número de empregados com carteira assinada, ultrapassando os 39 milhões de pessoas, enquanto o desemprego recuou para 5,6%, menor taxa desde 2012. De outro, enfrentamos enormes dificuldades na contratação e na retenção de mão de obra, sobretudo em um setor que exige jornadas extensivas, trabalho em feriados e dedicação em escala intensa.

Nas mesas de negociação salarial, realizadas em setembro e outubro, essa realidade se mostra com clareza. Empresários relatam os obstáculos para manter um quadro estável e qualificado. Há, de fato, uma escassez de trabalhadores dispostos a assumir os compromissos que o emprego formal demanda. Parte da chamada geração Z, por exemplo, prefere relações de trabalho mais flexíveis, de curto prazo, em que possam oferecer sua força de trabalho por alguns dias sem vínculo contratual. Esse modelo, no entanto, é incompatível com a legislação trabalhista vigente e com a necessidade de continuidade das operações no varejo alimentar.

Para enfrentar esse cenário, o Sincovaga tem buscado soluções criativas e parcerias estratégicas. Um exemplo é o projeto “50+”, voltado à inclusão de pessoas com mais de 50 anos que, muitas vezes, se aposentaram precocemente, mas ainda têm plena capacidade de contribuir. Além disso, trabalhamos junto a prefeituras, ao Governo do Estado e a outras entidades para ampliar alternativas de inserção no mercado.

Outro ponto sensível diz respeito ao regime especial para pequenas empresas, o Repis. Criado há mais de duas décadas, ele possibilita descontos de 5% a 10% sobre o piso salarial. Hoje, no entanto, o benefício perdeu relevância, já que muitos empregadores relatam dificuldade de contratação mesmo pagando acima do piso. Em alguns casos, a alternativa tem sido recorrer a mão de obra desqualificada, que gera dificuldades adicionais de adaptação.

É importante destacar também a complexidade da negociação coletiva em nosso setor. Representamos tanto gigantes do varejo, que empregam milhares de trabalhadores, quanto pequenos empreendedores com poucas lojas. Para os grandes, qualquer reajuste tem impacto multiplicado, exigindo cautela. Já para os pequenos, muitas vezes há espaço para reajustes maiores, mas prevalece a cultura de seguir estritamente o que está na convenção.

O papel do sindicato patronal, nesse contexto, é equilibrar interesses e buscar soluções viáveis para toda a categoria. Defendemos que o piso salarial, base da pirâmide, seja sempre reajustado um pouco acima da inflação, garantindo dignidade ao trabalhador e condições para a formação de equipes sólidas. Mas também alertamos para os limites da convenção coletiva: ela é um instrumento fundamental, mas não resolve problemas específicos de gestão interna, que dependem de preparo e sensibilidade dos gestores.

O varejo alimentar é um setor intensivo em mão de obra, essencial para o funcionamento da sociedade. Por isso, a pauta trabalhista exige um olhar cuidadoso, que considere não apenas índices econômicos, mas sobretudo as particularidades da atividade e a necessidade de assegurar tanto a sustentabilidade das empresas quanto a proteção dos trabalhadores.

Alvaro Luiz Bruzadin Furtado
Advogado, ex-procurador do Município e presidente do Sincovaga-SP (Sindicato do Comércio Varejista de Gêneros Alimentícios do Estado de São Paulo).

Fonte : https://www.migalhas.com.br/depeso/440559/mercado-de-trabalho-no-varejo-alimentar-desafios-e-caminhos-possiveis

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