Mercados de bairro encostam nos atacarejos na venda de itens como alimentos e produtos de higiene

Enquanto o atacarejo se consolida como “queridinho” dos brasileiros por causa dos preços mais baixos em compras de grandes volumes, os pequenos supermercados independentes − aqueles estabelecimentos de bairro resistem e mantêm a sua relevância no carrinho de compras do consumidor.

Com menos de cinco lojas que não chegam a mil metros quadrados de área por ponto de venda, hoje esse comércio responde por 21% do faturamento de todo consumo rápido comercializado no País.

No ano passado, esses supermercados faturaram R$ 230 bilhões com esses itens, valor comparável à cifra movimentada pelos atacarejos em igual período com produtos de consumo rápido, aponta um estudo da consultoria NielsenIQ. Nas contas da consultoria, a fatia de mercado dos atacarejos nas vendas de produtos de consumo rápido é de 22%.

“Os supermercados independentes, que integram o pequeno varejo, são tão grandes quanto o atacarejo (em produtos de consumo rápido)”, compara Gabriel Fagundes, líder para pesquisas sobre a indústria da consultoria.

Além da proximidade dos clientes, a importância desses pequenos estabelecimentos se deve ao fato de eles ocuparem uma brecha que existe, sobretudo no momento atual de escalada da inflação de itens básicos, como café, ovo e outros alimentos.

É que, em alguns casos, os produtos vendidos nos supermercados independentes têm um desembolso que cabe na carteira do consumidor. Essa adequação ocorre seja pelo tamanho reduzido das embalagens do produto, seja por se tratar de uma marca pouco conhecida e, portanto, mais em conta, aponta um estudo.

‘Precinho bom’

Essa tem sido a estratégia adotada por Euclides Fiuza, sócio do Minimercado Irmãos Fiuza, que funciona desde 1989, em Cidade Líder, bairro da Zona Leste de São Paulo.

Fiuza conta que tem abastecido as prateleiras com embalagens menores e optado por reduzir as margens de comercialização dos produtos, para ganhar nos volumes vendidos. “É para ficar com um precinho bom para o consumidor”, diz ele.

Desde dezembro, ele ampliou em 10% as vendas da sua loja, mesmo competindo com supermercados de rede e atacarejos que estão na vizinhança. “Como o pessoal compra pequenas quantidades, eles não vão longe de casa”, observa o pequeno empresário.

Fiuza destaca que um ponto crucial na estratégia é não deixar faltar nas prateleiras do seu supermercado o item procurado, porque, se o cliente não acha o que quer comprar, o estabelecimento perde credibilidade. “O que eles precisam, a gente sempre tem.”

Um chamariz que Fiuza usa para atrair a clientela para a sua loja é oferecer, por exemplo, pãozinho quente toda manhã. “Abrimos todos os dias às 6h30 com 100 pães assados e 100 no forno”, conta. E não se trata de pão congelado, mas preparado na padaria do supermercado.

A frequência de ida às lojas dos mercados independentes de vizinhança é elevada e isso ajuda a alavancar as vendas. O estudo mostra que durante um ano, um consumidor visita 74 vezes uma loja de supermercado independente, ante 16 vezes a loja de um supermercado de grande rede. E a maioria das compras nesse canal é de reposição (48%) e emergência (37%), o que garante a recorrência à loja. O estudo foi feito com base em notas fiscais de venda dos supermercados independentes e também visitas a lojas informais.

“Ele (consumidor) passa na loja do supermercado independente e, com o que tiver disponível no bolso, compra o que precisa para atender determinada necessidade”, diz Fagundes, da NielsenIQ.

Compras a conta-gotas

O comportamento de compras a conta-gotas, observa o consultor, tem ganhado relevância com o avanço do trabalho informal, que reduziu o peso da entrada do salário no quinto dia útil de cada mês. O resultado tem sido uma desconcentração do período de vendas nos supermercados ao longo do mês.

Fagundes observa também que, no momento atual de inflação elevada de alimentos, o consumidor considera tanto o desembolso quanto os preços na hora de escolher o tipo de loja que vai comprar.

Levar grandes volumes de produtos para casa por causa do preço baixo, como ocorre nos atacarejos, por exemplo, acaba tendo um custo muito alto pelo grande desembolso, se todo o volume não for consumido rapidamente. “Na prática, é dinheiro parado para o consumidor”, diz o consultor.

Já o gasto por ocasião de compra no supermercado independente é bem menor do que no atacarejo. O estudo mostra que o brasileiro desembolsa, em média, R$ 44 cada vez que vai ao supermercado independente, ante R$ 100 a cada visita ao atacarejo.

Na média, porém, uma mesma cesta de produtos é mais cara num supermercado independente do que numa grande loja de autosserviço de rede. No entanto, no caso de itens não prioritários para supermercados independentes, como aparelho de barbear, escova de dente, xampu, por exemplo, o preço médio é 5% menor em relação à média total do mercado.

Fagundes explica que o preço é menor para poder conseguir girar essas categorias que não são prioritárias e, com isso, a loja se mantém relevante perante o cliente. Já nas categorias prioritárias, o preço médio dos supermercados independentes é 4% maior em relação a grandes redes.

Potencial

O potencial de vendas dos supermercados independentes, que faz parte do pequeno varejo como um todo, é muito grande, observa Fabio Pina, consultor econômico do Sincovaga, sindicato que reúne os supermercados independentes no Estado de São Paulo.

“Em São Paulo, estamos acostumados com grandes redes, mas indo para o interior há muitos supermercados independentes e, em cada bairro de São Paulo, tem dois ou três mercados independentes”, observa Pina.

Um sinal do potencial do mercado atendido pelos mercados de vizinhança tem sido a investida frequente de grandes redes nesse segmento. A mais recente é da Oxxo, rede mexicana do Grupo Nós, que é uma joint venture entre a Raízen e a Femsa, multinacional mexicana líder no segmento de lojas de conveniência e de proximidade na América Latina.

Segundo Pina, não é a primeira vez que há tentativas de grandes empresas entrarem nesse segmento, padronizando os mercados de vizinhança. “As lojas acabam sendo pasteurizadas”, observa.

Isso explica, segundo Pina, o insucesso das grandes empresas nesse mercado de nicho. “Essas lojas só têm a proximidade local, mas não têm a proximidade pessoal. Isso faz a diferença”, afirma o consultor do Sincovaga.

A proximidade pessoal é o vendedor ou dono do mercadinho conhecer os seus clientes. Na loja de Fiuza, por exemplo, sete pessoas atendem a clientela: ele e a esposa, o sobrinho (sócio) e a esposa e mais três funcionários contratados com carteira assinada.

“A gente fala pouco ou subestima o pequeno varejo (que inclui o supermercado independente, lojas tradicionais com atendimento de balcão, restaurantes, bares e farmácias independentes)”, afirma Fagundes, da NielsenIQ.

O estudo aponta que 95% ou 1,121 milhão de pontos de comércio do País são pequenos varejo. Na América Latina, o pequeno varejo soma 3,6 milhões de lojas. No Brasil e em outros países da região, como Colômbia e México, o pequeno varejo está presente nas compras de quase a totalidade dos domicílios por causa da sua grande capilaridade.

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