As consequências jurídicas do assédio moral

Jurídico

Sabrina Renata Monteiro Armendane

O texto analisa o assédio no trabalho, os impactos legais e as medidas de prevenção.

Embora não exista uma lei específica de âmbito nacional tratando sobre o assédio moral no trabalho, segundo definição oficial da OIT – Organização Internacional do Trabalho, mais especificamente na Convenção 190, o assédio moral é o conjunto de comportamentos e práticas inaceitáveis, ou de suas ameaças, de ocorrência única ou repetida, que visem, causem ou sejam suscetíveis de causar danos físico, psicológico, sexual ou econômico, e inclui a violência e o assédio com base no gênero.

Ainda nesta senda, para Marie France Hirigoyen, o assédio moral no trabalho é qualquer conduta abusiva (gesto, palavra, comportamento, atitude…) que atente, por sua repetição ou sistematização, contra a dignidade ou integridade psíquica ou física de uma pessoa, ameaçando seu emprego ou degradando o clima de trabalho.

Em resumo, o assédio moral é qualquer conduta abusiva que venha expor alguém a situações de violência psicológica no trabalho, por meio de constrangimentos, humilhações e hostilidades, causando-lhe danos psicológicos, sociais e até físicos, a depender do adoecimento causado.

Além dos danos causados à vítima do assédio como depressão, ansiedade, estresse, dentre outros problemas de saúde mental, destaca-se que tal prática também traz consequências dentro e fora da empresa, na medida que há diminuição considerável na produtividade, ante a desmotivação causada, e aumento na rotatividade de funcionários, uma vez que a vítima, na maioria das vezes, acaba por pedir demissão ou se afastar do emprego. No âmbito externo, tal prática prejudica a imagem da empresa.

Apesar de ter sido mencionado no início do presente artigo acerca da ausência de lei específica de âmbito nacional tratando sobre o assédio moral no trabalho, vale ressaltar que há um conjunto de normas que sustenta a ilicitude da conduta, fazendo com que as decisões sejam baseadas em princípios constitucionais, CLT e CC.

Neste sentido, a Constituição Federal, já em seu art. 1º, coloca a dignidade da pessoa humana como um dos fundamentos do Estado Brasileiro, enquanto que o art. 5º acrescenta que “ninguém será submetido a tortura nem tratamento desumano ou degradante”, e que “são invioláveis a intimidade, a vida privada, a honra e a imagem das pessoas, assegurado o direito a indenização pelo dano material ou moral decorrente de sua violação”.

Em sequência, em se tratando de plano infraconstitucional, a própria CLT apresenta dispositivos que objetivam coibir condutas que podem ser, em certas circunstâncias, caracterizadoras do assédio moral, a exemplo da proibição de alteração unilateral ou prejudicial ao empregado (arts. 468 e 469 da CLT) e as vedações do art. 483, tais como:

O empregado poderá considerar rescindido o contrato e pleitear a devida indenização quando:

a) forem exigidos serviços superiores às suas forças, defesos por lei, contrários aos bons costumes, ou alheios ao contrato;

b) for tratado pelo empregador ou por seus superiores hierárquicos com rigor excessivo;

c) correr perigo manifesto de mal considerável;

d) não cumprir o empregador as obrigações do contrato;

e) praticar o empregador ou seus prepostos, contra ele ou pessoas de sua família, ato lesivo da honra e boa fama;

f) o empregador ou seus prepostos ofenderem-no fisicamente, salvo em caso de legítima defesa, própria ou de outrem;

g) o empregador reduzir o seu trabalho, sendo este por peça ou tarefa, de forma a afetar sensivelmente a importância dos salários.

O art. acima mencionado e descrito, que trata da rescisão indireta do contrato de trabalho, pode ser perpetrado por falta cometida pelo empregador que configure, inclusive, o assédio moral, como, por exemplo, as alíneas “a”, “b” e “e”.

Sendo o assédio moral cometido por colega de trabalho contra outro trabalhador, pode ser capitulado no art. 482, da CLT, que trata das infrações obreiras, a exemplo da alínea “b” (mau procedimento), assim como a alínea “j” (ato lesivo da honra ou da boa fama praticado no serviço contra qualquer pessoa, ou ofensas físicas, nas mesmas condições, salvo em caso de legítima defesa, própria ou de outrem).

Ocorrendo assédio moral dentro do setor público, agentes infratores podem ser submetidos a processo administrativo disciplinar, conforme preceitua a lei 8.112/1990, ficando expostos a medidas punitivas rigorosas.

Ressalta-se que, em se tratando de assédio moral cometido por colegas de trabalho contra outro empregado, a depender do caso, não há prejuízo na responsabilização, também, do empregador, por ser este o responsável por criar e manter o ambiente hígido de trabalho.

Contudo, em alguns casos, a empresa pode postular a ação regressiva por assédio moral, ou seja, a empresa pode intentar contra um empregado, especialmente um gestor ou superior hierárquico, que tenha causado danos à empresa ao praticar assédio moral contra um subordinado, visando, assim, recuperar as despesas que a empresa teve com a indenização da vítima do assédio, e tudo isso angariado no art. 37, §6º, da CF, bem como nos arts. 932, III, e 934, ambos do CC.

Já no campo regulamentador, o anexo II da NR-17 (aprovada pela portaria SIT 09/07), que versa sobre parâmetros mínimos para o trabalho em atividades de teleatendimento/ telemarketing, estabelece requisitos para garantir o conforto, a segurança, a saúde e o desempenho eficiente dos trabalhadores nessa área, quando estabelece em seu item 5.13 que “é vedada a utilização de métodos que causem assédio moral, medo ou constrangimento”.

Frisa-se, ainda, que acordos coletivos e convenções coletivas também podem prever cláusulas que proíbam a prática de assédio moral.

Além da Constituição Federal assegurar o direito à indenização pelo dano material ou moral decorrente de violação, o CC, por força dos arts. 186 e 187, também preconiza que, “comete ilícito toda pessoa que por ação ou omissão, negligência ou imprudência, violar direito e causar dano a outra pessoa”, bem como “comete ato ilícito o titular de um direito que, ao exercê-lo, excede manifestamente os limites impostos pelo seu fim econômico ou social, pela boa-fé ou pelos bons costumes”

Além disso, o art. 927, do mesmo diploma legal, diz que, “aquele que, por ato ilícito (arts. 186 e 187), causar dano a outrem, fica obrigado a repará-lo”.

Já no âmbito criminal, a prática do assédio moral pode vir a configurar crime, a depender dos atos praticados.

Há o enquadramento em crime de calúnia, isto é, quando é imputado ao assediado a prática de algum fato definido como crime, nos termos do artigo 138 do Código Penal. Noutro giro, caso o assediador ofenda, de maneira pública, a honra da vítima, poderá ser caracterizado crime de difamação, conforme dispõe o artigo 139 do mesmo diploma legal.

Numa terceira hipótese, podendo ser cumulativas entre si, caso o assediador ofenda a dignidade ou o decoro da vítima, poderá tipificar crime de injúria, nos termos do art. 140 do CP.

Em casos mais graves, o assediador pode ser enquadrado em crime de lesão corporal, tipificado no art. 129, do CP, crime de ameaça, com tipificação no art. 147, do CP, dentre outras possíveis situações.

Assim, ante as consequências advindas da prática do assédio, podendo resultar em indenizações por danos morais, rescisão indireta do contrato de trabalho e, em casos mais sérios, até mesmo a ações penais, é necessário ficar atento à preservação do “meio” laboral, sendo de responsabilidade do empregador manter um ambiente sadio e digno (arts. 2º, caput e 157, ambos da CLT), tanto por parte dos superiores hierárquicos, quanto dos subordinados, através da conscientização institucional, além de instigar os trabalhos em grupos e o respeito mútuo entre todos, como mecanismos preventivos que visem coibir qualquer ato que atente contra o ambiente de trabalho digno e saudável.

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Referências

Constituição da República Federativa do Brasil de 1988. Disponível em https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituicao.htm. Acesso em 15 de maio de 2025.

Decreto – Lei nº 5.452, de 1º de maio de 1943. Disponível em: https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto-lei/del5452.htm. Acesso em 19 de maio de 2025.

DELGADO, Maurício Godinho. Curso de Direito do Trabalho. 21ª edição. Editora JusPodivm, 2024.

HIRIGOYEN, Marie France. A violência perversa do cotidiano. Tradução: Maria Helen Huhner. Rio de Janeiro: Bertrand Brasil, 2010, p. 65.

Lei nº 10.406, de 10 de janeiro de 2002. Disponível em: https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/2002/l10406compilada.htm . Acesso em 15 de maio de 2025.

Organização Internacional do Trabalho – Disponível em https://www.ilo.org/pt-pt/media/68241/download. Acesso em 15 de maio de 2025.

Sabrina Renata Monteiro Armendane

Advogada associada no escritório Chalfun Advogados Associados. Pós Graduada em Direito Público. Pós Graduada em Advocacia Trabalhista pela Escola Superior de Advocacia – ESA.

Fonte : https://www.migalhas.com.br/depeso/443495/as-consequencias-juridicas-do-assedio-moral

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