O cenário em transformação
O comércio exterior brasileiro entrou em um ciclo de pressão sem precedentes. Em agosto de 2025, entrou em vigor, nos Estados Unidos, uma sobretaxa de até 50% sobre cerca de 36% das exportações brasileiras para aquele mercado, o equivalente a aproximadamente 4% do total exportado pelo País.
O impacto vai muito além dos números. Produtos que, historicamente, sustentaram a balança comercial, como café, carnes, frutas e autopeças, agora enfrentam uma barreira que afeta diretamente sua competitividade. Em setores de alta elasticidade de preço, esse tipo de medida não apenas reduz margens, como pode inviabilizar contratos e provocar retração permanente da presença em determinados mercados.
Esse movimento faz parte de uma tendência mais ampla: o aumento de políticas protecionistas e retaliatórias em diferentes regiões do mundo. União Europeia, China e países asiáticos também vêm revendo tarifas, regulamentos e subsídios, criando um mosaico de barreiras que muda rapidamente e torna cada operação internacional uma equação complexa.
O resultado é um ambiente no qual a previsibilidade, antes considerada um ativo no comércio global, dá lugar a uma instabilidade estrutural. O World Economic Forum, de janeiro de 2025, reforça essa visão. Já a McKinsey & Company aponta em seu relatório Global Economics Intelligence, de abril de 2025, que variáveis geopolíticas e comerciais já superam fatores macroeconômicos tradicionais como risco percebido para líderes empresariais.
O desafio invisível
A tarifa, em si, é apenas a ponta do iceberg. O real desafio é
com que essas medidas surgem, mudam ou são retiradas. Uma decisão tomada em um gabinete político pode, em poucas horas, alterar custos logísticos, margens, preços de venda e até a viabilidade de uma operação inteira.
Para muitas empresas, o problema não é apenas reagir, mas reagir a tempo. Modelos tradicionais de gestão comercial e de supply chain, baseados em revisões semestrais, relatórios retrospectivos e informações fragmentadas, simplesmente não acompanham o ritmo das mudanças atuais.
Essa defasagem informacional provoca uma cadeia de efeitos:
- Margens evaporam antes que as áreas de pricing consigam recalcular valores ou renegociar contratos;
- Rupturas de fornecimento ocorrem porque rotas alternativas ou fornecedores substitutos não foram identificados a tempo;
- Perda de participação de mercado, quando concorrentes conseguem ajustar rapidamente sua oferta ou acessar regimes tributários mais favoráveis.
O cenário é claro: a velocidade de resposta se tornou tão importante quanto a estratégia em si. E, no mundo de hoje, operar com dados defasados equivale a jogar um campeonato olhando apenas para os resultados da temporada passada. Pesquisa da Deloitte, de julho de 2025, confirma esse risco, apontando que apenas 23% dos CFOs avaliam positivamente a economia da América do Norte e que há um aumento na priorização de estratégias de resiliência frente à volatilidade tarifária. A BCG, de maio de 2025, estima que empresas que reagem rápido preservam até 30% mais margem em choques tarifários.
A estratégia de reação em tempo real
- Radar tarifário inteligente
Grandes empresas vêm criando hubs internos para monitoramento automatizado de tarifas, câmbio e regulações, consolidando informações e acionando as áreas estratégicas antes que as medidas entrem em vigor, segundo o The Supply Chain Exchange, de abril de 2025. - Simulação de impacto instantânea
Modelos preditivos recalculam, em poucos minutos, margens, preços e volumes diante de alterações tarifárias, câmbio ou logística, permitindo ajustes imediatos de estratégia, segundo relatório do BCG, em maio de 2025. - Supply chain adaptativo
A sueca Husqvarna realocou parte da produção da China para a Europa, e redirecionou remessas ao Canadá para evitar sobretaxas americanas. - Precificação responsiva
Em contexto de varejo, 46% dos compradores usam IA para otimização de preços, ajustando dinamicamente com base em tendências de mercado e comportamento do consumidor, segundo a Deloitte Retail Holiday Buyer Survey, de julho 2025. - Painel executivo integrado
Multinacionais líderes consolidam KPIs financeiros, indicadores tarifários e simulações em dashboards interativos permitem decisões coordenadas e rápidas no nível executivo. Spider Strategies, mai/2025.
O convite à reflexão
Tarifas e protecionismo já não são exceções — são o novo padrão. Empresas que monitoram, simulam e reagem em tempo real não apenas sobrevivem, mas transformam crises em oportunidades, enquanto outras ainda tentam entender o que aconteceu.
Agilidade é escala. Dados são capital. E o momento de agir é agora: implemente um radar tarifário, capacite sua equipe e transforme informação em decisão — antes que o próximo choque chegue.
5 perguntas que todo executivo deve responder hoje
- Identificamos mudanças tarifárias relevantes em tempo real?
- Podemos simular seu impacto sobre margem e volume instantaneamente?
- Conseguimos redirecionar nossa cadeia sem ruptura?
- Ajustamos preços com base em dados atuais?
- Temos um painel integrado que apoie decisões rápidas e alinhadas?
Marcelo Antoniazzi é CEO da Gouvêa Consulting.
Fonte : Mercado&Consumo.